terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Braga Cidade do Pós-Rock (parte 1)

A cidade de Braga nunca primou pela criatividade ou por qualquer espécie de dinamismo artístico. Existiu, contudo, uma fase maior, embora de curta duração, nos longínquos e discutidos anos 80 mas, por causa deste último factor, um pouco romantizada. Hoje, uma chama, de vez em quando, independente e de vontade autónoma com pequenas ou nulas consequências embora, por vezes, não desenquadrada e até reflexo de um tipo arquitectónico que transmite mais a sensação de ser constituída por uma qualquer variante genética do que fazer parte de um género.

O consumidor actual de música “urbana”, este “neo-indie” que se faz através da ligação exaustiva à internet e que privado de um myspace se desintegra, em Braga, não encontra acolhimento fora de casa. Não existe, praticamente, um espaço cultural, uma actividade ou um bar que o represente.

São poucos os projectos musicais, nas mais diversas vertentes, a conseguir algum tipo de projecção que supere a mera tentativa de uma semi-popularidade ou profissionalismo. Na realidade, a atitude geral resume-se a uma auto-satisfação míope que nos remete, aqui e ali, a essa preguiça inadaptada que foi política nos primeiros anos da década passada: “Não há apoios”, frase popular entre dezenas de grupos que, sem uma cultura de exigência que os motivasse, se desculpavam assim pelo facto de a demo de quatro temas registada num estúdio de quinta categoria não lhes ter posto uma major aos pés.
A democratização dos meios pouco alterou a situação. Um compêndio de dicas do estilo “Como promover o seu projecto na era da globalização” é insuficiente: pede-se conteúdo. Não basta embalá-lo. Mesmo que os cabecilhas do marketing musical contemporâneo evangelizem o oposto.

Perdura, em Braga, uma atitude de isolamento em relação a uma realidade exterior cujo carburador se encontra, actualmente, a parcos 50 quilómetros.
A cidade do Porto, nos últimos anos, tem vindo a desenvolver um projecto de iniciativa privada que, segundo alguns ideólogos, funciona como reacção a uma certa descrença na cultura de financiamento público. Este descolar, de geração espontânea e de múltiplo contágio, é motivado por um conjunto de interesses culturais mas também por um sentimento de inveja saudável que eclode, inevitavelmente, numa sensação de “perda interior”, num esvaziamento de personalidade num todo concreto mas, ao mesmo tempo, heterogéneo e multifacetado. Simplificando: um nicho cultural que se agiganta e que favorece o anonimato individual, alavanca essencial para o surgir de uma pequena cultura de determinação e exigência.
Uma geração emerge tendo como espelho o centro da cidade e cujas ramificações se começam a estender para lá das já famosas movidas da Rua Cândido dos Reis ou Galeria de Paris e que promete ressuscitar, num futuro pouco distante, zonas mortas; velhos fantasmas. Bares, associações culturais, galerias, concertos de rua, parcerias múltiplas ou o rejuvenescimento do vinil são pequenos fenómenos que convergem e, apesar da natural competição, vislumbra-se algum espírito de colaboração que acolhe artistas, artistas wanna-be e todo um conjunto de aspirantes. No meio de tudo isto, diferentes categorias de um público que não anseia “integrar-se” mas que reconhece qualidade na oferta: o “beto” já não se fica pela Foz do Douro nem o gótico se esconde no Heavens.

Embora ainda circunscrita, a tendência, pensa-se, será a de uma valorização crescente de determinados conceitos confirmando o que alguns sociólogos culturais anunciam em livros da especialidade há já alguns anos: a necessidade de impulsionar um leque de forças que dêem consistência a algo que se possa apelidar de “cidade criativa”; resposta a um empobrecimento económico e habitacional de zonas históricas que foram sendo progressivamente abandonadas. No fundo, um certo espírito de ocupação que traga investimento e algum repovoamento.
O fenómeno não passou despercebido à Câmara Municipal e, num gesto inédito, encomendou um estudo a Tom Fleming, consultor britânico, que teve como título “Desenvolvimento de um Cluster de Indústrias Criativas na Região Norte” cujo resultado foi a constituição da Addict, agência sem fins lucrativos que tem como objectivos servir de rede de contacto bem como a promoção e a desburocratização do sector.
Convinha-nos, por isso, desviar as atenções para o que se está a passar, dentro deste espectro, na cidade do Porto. Por aqui perdura ainda um espírito de fanzine interrompido apenas por casos pontuais que, embora muitas vezes interessantes, são insuficientes em época de crise subprime.
(in_Diário do Minho/Afonso Pimenta 03/02/2009)

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